Da escolha de insumos nacionais à adaptação de equipamentos, a inovação vem moldando o presente e o futuro da cervejaria artesanal brasileira
Inovar é mais do que lançar novos rótulos. Essa é uma das reflexões de Carlos Bressiani, diretor-geral da Escola Superior de Cerveja e Malte, ao falar sobre os caminhos da inovação no setor cervejeiro.
A Escola Superior de Cerveja e Malte é uma instituição referência na formação de profissionais, assim como na oferta de serviços, eventos e fortalecimento do setor.
Em entrevista à Beerpass para a BeerWeek 3.0, Bressiani compartilhou um panorama atual do mercado, os desafios do setor e as oportunidades reais para quem busca se destacar, especialmente em tempos de recuperação e adaptação.
Para Carlo, a inovação em produto ainda existe, mas ela passou a acontecer também nos bastidores: no uso de insumos nacionais, em processos industriais mais eficientes, em novos equipamentos.
“O mercado perdeu um pouco o ritmo nos últimos anos, e consequentemente teve uma queda no lançamento de produtos. Se olharmos os números do Anuário do Mapa, isso acaba ficando evidente”, explica.
Dentro disso, ele destaca a questão dos insumos nacionais. Primeiro veio a produção de malte fora das grandes maltarias, com produtos bem diferenciados. Depois veio o avanço do lúpulo nacional, que vem crescendo ano após ano. Bressiani cita a Copa de Lúpulos, cuja inscrições vem subindo, refletindo o aumento no número de fazendas que estão produzindo.
Agora, as leveduras nacionais também entram nesse movimento. “Primeiro houve o crescimento de algumas fábricas aqui no Brasil, replicando leveduras de outros países e hoje a gente já tem algumas que estão nascendo 100% nacionais, de fato”, explica.
Ele também cita o uso de ingredientes brasileiros na cervejaria artesanal, como frutas, raízes e outros.
Outra frente importante de inovação no mercado cervejeiro está nos processos produtivos. Embora a maioria das empresas ainda fabrique equipamentos padronizados para cervejarias, algumas se destacam por apostar em soluções diferenciadas.
Já há empresas que desenvolvem equipamentos normalmente acessíveis apenas para grandes indústrias, mas adaptados para o uso em microcervejarias.
Isso permite que pequenos produtores tenham acesso a tecnologias avançadas, otimizando sua produção e elevando a qualidade dos seus produtos.
E claro, também há a inovação que abrange os canais de distribuição e venda. “Possibilidade dos serviços 24h em alguns pontos de venda com produto automatizado”, explica Carlo.
Mas há alguns desafios a serem analisados. Atualmente, há um cenário entre cervejarias e pontos de venda que envolve certa disputa por preços. De um lado, bares e estabelecimentos buscam as melhores condições para garantir rentabilidade. Do outro, as cervejarias competem entre si para ocupar esses espaços.
Nesse contexto, a educação do consumidor acabou ficando em segundo plano. “Não foi por escolha, mas por necessidade”, complementa. Carlo ressalta que tanto cervejarias quanto pontos de venda ainda lidam com os impactos da pandemia. A diferença é que, por não serem negócios de capital intensivo, os bares passaram por ciclos de fechamento e reabertura com mais frequência.
Na área de produção da cervejaria artesanal há infinitas possibilidades de tecnologia, desde sistema de automatização até os sistemas de gestão e coleta de dados.
“Já na parte do serviço, toda automação é bem-vinda”, fala Bressiani. Ele analisa que o mercado também tem um problema com mão de obra, que chega a ser escassa.
“E fora isso você quebra uma fronteira, possibilitando o trabalho em tempo estendido. Há também o uso do autosserviço interligado a outros sistemas, enfim, a tecnologia hoje permeia tudo”, afirma.
Há um grande potencial no uso da tecnologia do autosserviço na cerveja artesanal. Principalmente quando ela anda lado a lado com a experiência. Isso porque, segundo Carlo, a cerveja artesanal exige também uma educação do consumidor.
“Por exemplo, algumas pessoas podem estranhar certas cervejas, como uma Ipa ou uma Sour”, relata. “Isso pode ser feito através da tecnologia também, nada impede que tenham telas com explicações, por exemplo”, conta.
Para quem busca por uma real inovação, Carlo orienta primeiro a conhecer, de fato, o seu cliente.
“A diferença de uma ideia e de uma inovação é que a inovação ela tem que dar resultado financeiro. Então, ideia todo mundo tem um monte, agora transformar isso em algo que melhore o resultado tem que partir do conhecimento do cliente”, orienta.
Ou seja, o empreendedor precisa entender as vontades do cliente, buscar as demandas e a partir daí criar produtos, canais de distribuição, de acesso e comunicação para gerar conhecimento, engajamento.
Por fim, Carlo é direto: “O mercado não vai morrer”. Ele cita o exemplo dos Estados Unidos, onde, após um período de rápido crescimento, o setor passou por uma década de estagnação antes de viver uma nova onda de expansão. Para ele, o cenário brasileiro pode seguir caminho semelhante.
“O processo de inovação está diretamente ligado à adaptação. Envolve entender o mercado, o cliente, o produto… e, a partir disso, se preparar para a próxima onda de crescimento. A gente não sabe quando ela virá, mas quem conseguir se adaptar e inovar estará pronto para ela”, conclui.
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